Na reabertura hoje, dia 19/03, do Grupo de Estudos de Direito de Família do IARGS, a diretora secretária do instituto, a advogada Liane Bestetti, palestrou sobre o tema “Feminicídio para além da Lei Maria da Penha”, sendo recepcionada pela vice-presidente Lucia Kopitke.
Inicialmente, a Dra. Liane explicou a origem da palavra feminicídio, referindo que a expressão é utilizada para denominar morte violenta de mulheres em uma situação discriminatória. Trata-se, conforme explicou, de uma palavra nova no contexto das mulheres para explicar quando elas sofrem violência ao ponto de morrerem.
Logo em seguida, a advogada informou que foi aprovada ontem, dia 18/03, uma Súmula do Conselho Federal da OAB segundo a qual a violência contra a mulher constitui fator apto a caracterizar a ausência de idoneidade moral necessária para inscrição na Ordem, independente da instância criminal.
Na sequência, descreveu os dois tipos de feminicídio de acordo com a legislação brasileira: íntimo e não íntimo. No primeiro, quando há menosprezo ou discriminação à condição de mulher e, no segundo, quando não há relação próxima ou familiar com a vítima, não configurando, neste caso, a relação íntima de afeto prevista na Lei Maria da Penha. “A forma como a pessoa é morta é fundamental para entender e identificar se é ou não caso de feminicídio não íntimo”, esclareceu a advogada.
A Dra. Liane explanou, ainda, que, na tentativa de contribuir e facilitar a identificação clara do tipo penal, o Escritório ONU Mulheres no Brasil, em parceria com a SPM (Secretaria Nacional de Política para Mulheres), elaborou as “Diretrizes Nacionais Feminicídios – Investigar, Processar e Julgar com Perspectiva de Gênero as Mortes Violentas de Mulheres”. Este documento, disse, serve como elemento para auxiliar agentes do sistema jurisdicional e, dessa forma, reunir elementos que possam servir para evidenciar as razões de gênero a partir de uma análise das circunstâncias do crime, das características do agressor, da vítima e do histórico de violência.
No Código Penal, acentuou, o feminicídio é considerado um crime hediondo e uma circunstância qualificadora do crime de homicídio, estando tipificado nos termos do artigo 121 do Código Penal Brasileiro.
Como exemplos citou a Apelação Crime nº 70078368537, Primeira Instância Criminal, TJ/RS (Relator Jayme Weingartner Neto) e o Recurso em Sentido Estrito nº 70076429604, Terceira Câmara Criminal, TJ/RS (Relator Diogenes Vicente Hassan Ribeiro).
Fazendo uma análise com a Lei Maria da Penha, a advogada esclareceu que, conforme previsto no inciso I do parágrafo 2º-A, do art 121 do CP, considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve violência doméstica e familiar. Ela advertiu que, embora a Lei Maria da Penha (LMP) seja uma das legislações mais rigorosas e mais avançadas sobre o tema, não há no seu texto a previsão de crime de feminicídio (previsto pelo CP).
Por outro lado, salientou que as medidas protetivas previstas na LMP poderão ser aplicadas à vítima de feminicídio de forma a evitar novas agressões, garantindo a ela proteção. Tais pedidos, disse, deverão, em regra, ser analisados pelas Varas do Tribunal do Júri, e não pelos Juizados da Violência Doméstica.
Baseando-se em uma notícia do Jornal O Globo (RJ), Liane informou que, somente neste ano de 2019, houve 344 casos de feminicídio — 207 episódios consumados e 137 tentativas, em crimes ocorridos em todos os estados brasileiros, além do Distrito Federal. A média é de 5,31 casos por dia, ou um caso a cada quatro horas e 31 minutos nos primeiros 64 dias do ano.
Para concluir, a Dra Liane Bestetti enfatizou que o feminicídio é a faceta mais perversa da violência doméstica. “É o último grau da brutalidade praticada contra as mulheres. É somente a ponta do iceberg”, destacou.
Terezinha Tarcitano
Assessora de Imprensa